Com a explosão de casos de dengue no Distrito Federal, muitos procuram a internet ou recebem orientações de outras pessoas para se tratarem da doença. No entanto, especialistas ouvidos pelo Correio apontam que informações equivocadas, como automedicação, podem gerar complicações no estado de saúde e, até mesmo, levar a óbito.
De acordo com o Ministério da Saúde, não há um tratamento específico para a doença. O principal modo de amenizar os efeitos da dengue é a reposição de líquidos. É o que defende o infectologista Julival Ribeiro, que acrescenta que a automedicação é extremamente perigosa, sendo necessário atendimento médico antes de qualquer medida.
“A população deve saber que existem determinados medicamentos, chamados de anti-inflamatórios, como o ibuprofeno, diclofenaco, fenilbutazona, entre outros, além dos medicamentos corticoides, como o prednisona, dexametasona e hidrocortisona. Todos eles devem ser evitados, porque podem causar um quadro grave da doença. Antes de qualquer automedicação, o paciente deve e precisa procurar atendimento médico”, reitera o especialista.
Julival destaca que, na maioria dos casos, médicos indicam a utilização de dipirona e paracetamol — esse último, caso usado em excesso, pode causar toxicidade ao fígado. Os dois ajudam a amenizar a febre alta e o desconforto, sem apresentar riscos, como os anti-inflamatórios e os corticoides, e são orientados pelos profissionais em dosagens corretas.
Perigo dos “chazinhos”
“O tratamento mais importante, no caso de suspeita ou confirmação da dengue, é se hidratar o quanto antes, mesmo que não tenha procurado atendimento médico. A hidratação é fundamental, porque evita, inclusive, complicações”, enfatiza. “Sobre essas questões de chá, como andam dizendo que a folha do mamão ajudaria, a dengue é uma doença causada pelo mosquito Aedes aegypti. Em nada tem a ver com mamão ou outras coisas, isso porque não há um tratamento específico ainda”, reforça Julival.
Manuel Palacios, infectologista do Hospital Anchieta, explica que, de fato, os sintomas da dengue e da covid-19, em um primeiro momento, são bastante semelhantes. Ao contrário da dengue, por exemplo, anti-inflamatórios são orientados para quem está com o vírus da covid-19.
“Na covid-19, podem ser utilizados anti-histamínicos e antialérgicos. Na dengue, geralmente, necessita apenas do antialérgico após o sexto, sétimo dia. É preciso diferenciar o que é um e o que é outro, porque muitos sintomas ocorrem com mais frequência em um e praticamente em nenhuma outra pessoa. Por isso, a necessidade de procurar um médico”, reforça.
Palacios acrescenta que, mesmo com a onda de desinformação nas redes sociais de pessoas indicando o uso de chás para o tratamento da dengue, o especialista observa que não há comprovação alguma de que esses “remédios caseiros” possam ajudar a amenizar os efeitos da doença.
“Todas as afirmações, inclusive essa de folha de mamão, são falsas. Isso não melhora o número de plaquetas de pacientes com a dengue, muito menos ajuda a prevenir ou melhorar quadros de pessoas com o vírus. Não há comprovação científica de que isso ajuda”, assinala. “Se possível, não consuma esses chás que são sugeridos nas redes sociais. Não é porque façam mal, mas porque vão atrasar a procura a um serviço de saúde, aumentando a chance de a doença se tornar grave”, acrescenta o especialista.
Tendas lotadas
Na semana passada, o governador Ibaneis Rocha afirmou que os hospitais públicos e privados entraram em colapso. Uma das saídas encontradas pelo governo do Distrito Federal para dar conta da procura por atendimento são as tendas. Ontem, a reportagem esteve nas unidades de São Sebastião e Estrutural.
Em São Sebastião, a coordenadora do local, Fernanda Alves, falou que há dias em que as tendas estão praticamente sem capacidade, comportando 50 pessoas ou mais. Dependendo do horário, os profissionais de saúde não conseguem dar conta da demanda, porque o atendimento vai até as 19h.
“Este domingo é atípico. Sábado, na coordenação, não tinha uma cadeira vazia. Hoje (ontem) foi um dia diferente. Agora, estamos com um médico, mas estamos dando conta porque está vazio”, detalha. A farmacêutica afirma, porém, que as tendas estão fazendo um ótimo trabalho no DF. Para ela, as pessoas estão recebendo um bom atendimento, apesar da superlotação em determinados dias da semana.
Cerca de 20 pessoas esperavam por assistência na tarde de ontem, em São Sebastião. Lá, elas recebiam suporte, como medicação e classificação da dengue (tipo A, B ou C). “Os pacientes que conseguimos estabilizar aqui são atendidos na tenda, recebem soro ou medicamento intravenoso. Aqueles que não conseguimos atender, passam pelo médico, que solicita a remoção para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA)”, detalha Fernanda.
Busca por ajuda
Apesar das dificuldades diárias, a coordenadora conta que o trabalho tem fluído de maneira positiva, com o intuito de ajudar a população. Gleidison Silva, 22 anos, conta que tem se sentido mal desde quinta-feira. Tontura, dor de cabeça e náusea são alguns dos sintomas sentidos. “No sábado, vomitei sangue e me assustei. Tomei bastante água e dipirona, que baixou a febre”, comenta.
Assim que relacionou os sintomas com a possibilidade de dengue, correu para a tenda. Gleidison diz que recebeu assistência rapidamente e que tem melhorado com o passar do tempo. Depois de ter tomado soro, ele conta que o corpo tem reagido melhor.
“Não consigo parar de sentir essa dor infernal nos ossos”. Eliomário Santos, 53, deitou-se em cima de uma formação de três cadeiras enquanto esperava por auxílio na tenda de São Sebastião. Os sintomas, segundo o morador da região, começaram na sexta-feira. Fortes dores no corpo, dor nos olhos e muita dificuldade para conseguir se locomover são os principais.
Na Estrutural, o movimento foi menos intenso ontem. Dona Maria de Souza, 71, estava na parte interna da tenda recebendo soro. Cansada e fraca, a faxineira diz que os sintomas de dengue começaram no sábado. “Estou sentindo muita tontura, náusea, e dor nos ossos. Consegui atendimento assim que cheguei aqui”, destaca.
Infectados
O último boletim epidemiológico da dengue, divulgado, na terça-feira, pela Secretaria de Saúde, dos 81.408 casos prováveis da doença, 1.695 eram de moradores de Goiás. Ceilândia apresenta o maior número de casos prováveis (14.718), seguida de Taguatinga (4.428), Sol Nascente/Pôr do Sol (4.352), Brazlândia (4.069) e Samambaia (3.378).
Na busca por ações de combate contra a dengue, o governo do Distrito Federal (GDF) tem realizado, aos sábados, mobilizações em regiões administrativas na capital do país. No sábado, o Varjão recebeu o Dia D, para atuar no atendimento aos pacientes com sinais da doença, além do trabalho para com a vacinação da população. Cerca de 26 profissionais da saúde estiveram presentes no evento,
No próximo sábado, o dia D será realizado no Sol Nascente. A vice-governadora Celina Leão (PP), afirmou, no local, que o governo do DF tem trabalhado no combate à doença. De acordo com ela, tanto as ações sociais quanto as tendas demonstram o foco com a diminuição e contenção de casos relacionados à dengue.
“A gente entende a importância de o governo estar presente ao lado da comunidade, temos a oportunidade não só de trazer serviços, mas de ouvir a população, as demandas e as reivindicações”, concluiu.
Reforço
A Secretaria de Saúde reforçou, em nota, que os principais focos de dengue estão nas residências, em locais como pratos, vasos, garrafas, pneus e latas. Pelo menos 90 escolas públicas foram vistoriadas em busca de possíveis pontos de contaminação, antes do início das aulas.
A pasta diz, ainda, que criou o Plano de Enfrentamento da Dengue e Outras Arboviroses válido para o triênio (2024 – 2027) e que o período sazonal da doença vai de outubro a abril.
Por fim, a SES-DF lembra que foram instaladas tendas e houve o reforço das equipes de saúde com militares do Corpo de Bombeiros e, no atendimento à população, com militares da Aeronáutica.
Por Eduardo Fernandes, Pablo Giovanni do Correio Braziliense
Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press / Reprodução Correio Braziliense