Mais de 3 mil educadores da rede pública de ensino estão afastados por problemas de saúde mental. Segundo a Secretaria de Educação do DF (SEEDF), o programa Diretoria de Qualidade de Vida e Bem-Estar no Trabalho (DQVT) é uma iniciativa de implementar, acompanhar e avaliar ações, projetos e programas direcionados à promoção de saúde e a valorização desses profissionais.
Preferindo não se identificar, uma profissional de educação que trabalha na rede pública conta que tem transtorno de ansiedade e percebeu que às vezes, as condições de trabalho, deixam o profissional muito tenso e estressado. “Aão muitos estudantes para a gente atender. Dou aula para 12 turmas e os problemas sociais que avassalam o nosso país, refletem na sala de aula. Como a falta de comida, moradia e de muitos recursos para as famílias”.
Além disso, a professora cita que casos de violência também estão muito fortes nas escolas. “Tudo isso favorece o medo dos profissionais”.
A professora atua há 30 anos como servidora pública e acredita que toda a falta de estrutura da vida do aluno fora da escola, afeta a sala de aula e os professores diretamente. “Como eu dou aula sabendo que um aluno meu foi ali para merendar e que provavelmente aquela será a única alimentação do dia dele?”, reflete. Ela adoeceu com o dia a dia de trabalho, ficou quatro meses de licença pela primeira vez, depois mais três meses.
“Tomei medicação, faço terapia até hoje. Mas percebo que se eu me afasto, melhoro, mas ocasionalmente a gente sofre com tudo isso”.
Em tratamento desde 2011, a professora acredita que a Secretaria de Educação deveria oferecer mais políticas públicas para trabalhar o lado emocional dos professores contra o adoecimento em função do trabalho preventivamente. “Para não sermos esponja e absorver tudo isso”. Ela acredita que não tem como esses casos de problemas de saúde mental não acontecerem, mas que eles podem ser evitados ou acompanhados.
Deixar o trabalho para tentar encontrar um equilíbrio e se cuidar quando precisou, não foi fácil. “É uma tristeza tão grande saber que tive que sair, me senti impotente. Aquilo foi uma preocupação muito grande para mim”. Ela sente que hoje em dia na escola, o trabalho é de enxugar seco, tendo que disputar com as novas mídias para ter a atenção dos alunos. “É um esforço muito grande que fazemos diariamente em sala de aula”.
Hoje, a professora está trabalhando e conta que toma remédio todos os dias para ansiedade e depressão. “Sinto uma necessidade de tomar até para dormir. Mas é muito difícil a gente se despertar com esse tanto de remédio. De qualquer forma, nem por isso meus olhos deixam de brilhar perante o meu ofício”.
Causas do adoecimento do profissional de educação
A neuropsicóloga Juliana Gebrim, acredita que as causas de ter tantos professores afastados, vão desde a remuneração ruim, a carga horária de trabalho, a má condição de políticas públicas para acolher esses profissionais na área educacional. “Muitas vezes o impacto da educação que os alunos recebem em um âmbito familiar pode refletir dentro da sala de aula e o professor tem que lidar com isso”.
Para Juliana, o cuidado com a saúde mental do profissional de educação deveria ser uma garantia dentro do cargo do governo. “Ter políticas públicas para cuidar da saúde mental desse profissional é fundamental para ele arcar com essas questões associadas a um ambiente que muitas vezes se torna pesado”. Até porque, a doutora acredita que o professor atua na base da cadeia social, ao estar preparando esses alunos que são o futuro do país. A juventude daqui a pouco vai estar comandando o país substituindo a nossa força de trabalho”.
Élbia Pires é diretora de saúde do Sindicato dos Professores do DF, e considera que a primeira e principal questão para o adoecimento desses professores, que vai resultar no afastamento de muitos, está relacionada às condições de trabalho que provocam uma série de ansiedade, medos e insegurança na categoria. “Claro, a gente não nega fatores externos ao trabalho, como o pós-pandemia e as relações sociais, mas no que diz respeito ao adoecimento da nossa categoria, tanto a estrutura física das escolas, quanto o grande número de professores em contratação temporária influenciam esse quadro”.
Mesmo com a convocação dos três mil servidores, Élbia afirma que há questões em torno da educação inclusiva dos estudantes especiais, que impactam os professores também. “A ausência desses monitores e educadores sociais voluntários provoca uma sobrecarga para os nossos colegas professores”.
Promoção da saúde e valorização do servidor
A pasta de Educação do DF informa que o programa Diretoria de Qualidade de Vida e Bem-Estar no Trabalho (DQVT), visa reconhecer a integralidade e direito ao bem-estar individual e coletivo no ambiente de trabalho, com projetos que promovem a autonomia e a participação dos servidores da SEEDF. A iniciativa também trabalha em prol da melhoria do ambiente organizacional e dos processos de trabalho, além de incentivar a corresponsabilidade, o envolvimento e a conscientização dos profissionais, enquanto servidores públicos.
Segundo a SEEDF, a portaria Nº 1.062, de 17 de outubro de 2023, estabeleceu um marco legal na área de saúde mental, por meio da criação do Programa de Saúde Mental no Trabalho (Prosm) para os Profissionais da Educação da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal.
Em nota, a pasta cita vários projetos e ações desenvolvidas para a valorização dos profissionais de educação, bem como: o Programa de Acolhimento Psicológico Individual (Papsi); o Programa de Prevenção à Dependência Química (Prodeq); o projeto Acolhimento em Situação de Crise; a Clínica do Trabalho com Gestores, com foco no assédio e mediação de conflitos; Escuta Sensível e Cantoterapia; Gerenciamento de Estresse; Campanha “Janeiro Branco”, com o objetivo de conscientizar sobre a Saúde Mental; Campanha “Setembro Amarelo”, com o objetivo de promover reflexões sobre o combate ao suicídio; e “Março das Mulheres Educadoras”, por meio de ações que despertam para a valorização da mulher e servidora pública pela sociedade.
Por Amanda Karolyne do Jornal de Brasília
Foto: Felipe de Noronha/SEE-DF / Reprodução Jornal de Brasília