Uma técnica avançada de ressonância magnética poderá identificar alterações cerebrais antes que o Alzheimer comece a se manifestar, abrindo uma janela de tempo para intervenções terapêuticas capazes de frear a progressão do mal. Um estudo publicado na revista científica Radiology, da Sociedade Radiológica da América do Norte (RSNA), demonstrou que o chamado mapeamento de suscetibilidade quantitativa (QSM, na sigla em inglês) é capaz de prever quem tem risco aumentado de desenvolver comprometimento cognitivo leve (CCL) — estágio intermediário entre o envelhecimento normal e a demência.
A cada três segundos, uma nova pessoa é diagnosticada com algum tipo de demência no mundo. O Alzheimer, forma mais comum da doença, responde por cerca de 60% a 70% dos casos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Há décadas, os especialistas sabem que o cérebro começa a sofrer alterações muito antes de os primeiros sinais se manifestarem. Mudanças microscópicas, invisíveis a olho nu, vão corroendo lentamente as funções cognitivas até que sintomas como perda de memória, dificuldade de raciocínio e alterações de comportamento se tornem irreversíveis.
“Se conseguirmos identificar os indivíduos em risco ainda na fase assintomática, poderemos pensar em estratégias de prevenção, intervenções mais precoces e acompanhamento mais cuidadoso”, explicou o neurorradiologista Xu Li, autor senior do artigo e pesquisador do Kennedy Krieger Institute, nos Estados Unidos, Segundo ele, o estudo sugere que o ferro cerebral pode ser tanto um marcador quanto um fator ativo no processo que leva ao Alzheimer.
A equipe analisou 158 adultos cognitivamente saudáveis, participantes do estudo de longo prazo Biocard, que acompanha voluntários de meia-idade e idosos sem sintomas de demência. Todos se submeteram ao exame de ressonância magnética com QSM, capaz de mapear o ferro presente em regiões cerebrais estratégicas, como o córtex entorrinal e o putâmen — áreas fundamentais para a memória e o controle motor. Parte dos voluntários também realizou exames de PET scan para detectar a presença de placas de beta-amiloide, proteína associada ao Alzheimer.
Testes
Durante até sete anos e meio de acompanhamento, os pesquisadores observaram quem desenvolveu comprometimento cognitivo leve. Indivíduos com maior acúmulo de ferro nas regiões mapeadas apresentaram risco significativamente maior de progressão para o CCL, além de um declínio cognitivo mais rápido nos testes neuropsicológicos.
Quando os níveis elevados de ferro cerebral eram combinados à presença de beta-amiloide detectada pelo PET, o risco era ainda maior. “Isso sugere um efeito sinérgico, em que a sobrecarga de ferro amplifica o impacto das proteínas tóxicas relacionadas ao Alzheimer”, afirmou Li. O especialista diz que não se trata apenas de um marcador estático: o ferro pode estar envolvido ativamente nos mecanismos de degeneração neuronal.
A descoberta reforça o potencial da QSM como biomarcador clínico para rastrear indivíduos em risco de demência, principalmente em populações envelhecidas, alega o estudo. Diferentemente do PET, exame caro e pouco disponível, a ressonância magnética já faz parte da rotina hospitalar e poderia ser adaptada para incorporar o mapeamento de suscetibilidade sem grandes barreiras técnicas.
“Estamos apenas arranhando a superfície. Precisamos de estudos maiores, com populações mais diversas, para confirmar a utilidade clínica dessa abordagem”, ponderou Li. Ele destacou que a Johns Hopkins já planeja novas fases de pesquisa, inclusive, para avaliar se o monitoramento do ferro cerebral pode orientar terapias em desenvolvimento.
Por Painel da Cidadania
Fonte Agência Brasília
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