Os efeitos colaterais de diferentes antidepressivos foram classificados pela primeira vez, revelando grandes diferenças entre os medicamentos.
Pesquisadores analisaram o impacto das medicações nos pacientes nas primeiras oito semanas após o início do tratamento — algumas levaram ao ganho de até 2 kg e a variações na frequência cardíaca de até 21 batimentos por minuto.
Dados do último mapeamento sobre a doença realizado pela OMS apontam que 5,8% da população brasileira sofre de depressão, o equivalente a 11,7 milhões de brasileiros.
Os cientistas alertaram que essa grande diferença nos efeitos colaterais pode afetar a saúde das pessoas e sua capacidade de manter o uso contínuo do remédio.
Eles destacaram que ninguém deve interromper o tratamento por conta própria, mas defenderam que os antidepressivos sejam ajustados de forma mais precisa às necessidades de cada indivíduo.
“Há grandes diferenças entre [os antidepressivos], e isso é importante não apenas para pacientes individualmente, mas também porque um grande número de pessoas os utiliza — então, mesmo mudanças modestas podem ter um grande impacto em toda a população”, disse o pesquisador professor Oliver Howes.
Sempre se soube que antidepressivos afetam a saúde física. O estudo do King’s College London e da Universidade de Oxford é o primeiro a criar um ranking que permite comparar facilmente os efeitos dos medicamentos.
A equipe analisou 151 estudos sobre 30 fármacos comumente usados no tratamento da depressão, envolvendo mais de 58,5 mil pacientes.
Nem todos desenvolvem efeitos colaterais, mas, em média, os resultados publicados na revista médica The Lancet mostraram que:
- Um tratamento de oito semanas com agomelatina foi associado a uma redução de 2,4 kg no peso corporal, em comparação com a maprotilina, que levou a um ganho de quase 2 kg;
- Houve uma diferença de 21 batimentos por minuto na frequência cardíaca entre a fluvoxamina, que reduziu o ritmo do coração, e a nortriptilina, que o acelerou;
- Foi observada uma diferença de 11 mmHg na pressão arterial entre nortriptilina e doxepina.
“Claramente, nenhum antidepressivo é igual ao outro”, afirmou o Dr. Atheeshaan Arumuham, do King’s College London.
Essas diferenças podem se somar de maneiras que se tornam clinicamente relevantes, incluindo um aumento no risco de infarto ou derrame.
Isso significa que, mesmo com o mesmo diagnóstico, pacientes diferentes podem se beneficiar mais de antidepressivos distintos, dependendo de suas preferências e de outras condições de saúde.
O dr. Toby Pillinger disse ao programa Today, da BBC Radio 4: “A maioria dos estudos que analisamos era relativamente curta. Estamos falando de uma duração de oito semanas, e ainda assim observamos grandes mudanças em parâmetros de saúde física que, acreditamos, têm relevância clínica”.
“A última coisa que quero é que essa notícia assuste as pessoas. Quero que isso sirva para dar poder aos indivíduos, incentivando-os a tomar a iniciativa e participar das decisões junto com seu médico”, acrescentou ele.
Qual antidepressivo é o melhor para mim?
Em um cenário hipotético, Sarah, 32, John, 44, e Jane, 56, receberam o mesmo diagnóstico de depressão e a recomendação de tomar antidepressivos.
Mas cada um deles quer evitar efeitos colaterais diferentes.
Pillinger, que analisou os exemplos para a BBC, diz que cada um receberia a recomendação de um medicamento diferente.
Sarah, 32, diagnóstico de depressão e quer evitar ganho de peso;
O médico Toby Pillinger recomenda que Sarah use um antidepressivo que não cause ganho de peso, como agomelatina, sertralina ou venlafaxina, em vez de amitriptilina ou mirtazapina, que têm maior probabilidade de aumentar o peso corporal.
John, de 44 anos, também tem depressão, e sua prioridade é evitar efeitos colaterais que agravem seu quadro de pressão alta;
Segundo o especialista, ele deve evitar medicamentos como venlafaxina, amitriptilina ou nortriptilina, que elevam a pressão arterial, e optar por opções como citalopram, escitalopram ou paroxetina.
Jane, de 56 anos, tem o mesmo diagnóstico e colesterol alto;
A recomendação médica é que ela evite venlafaxina, duloxetina e paroxetina. Citalopram ou escitalopram são opções mais neutras em relação ao colesterol e podem ser mais adequadas para ela.
Defesa pelo uso de medicamentos genéricos e de baixo custo
Os pesquisadores afirmam que é simplista demais dizer que existem antidepressivos “bons” e “ruins”. Embora a amitriptilina aumente o peso, a frequência cardíaca e a pressão arterial, ela também ajuda a aliviar dores e problemas de sono.
De modo geral, a classe mais prescrita de antidepressivos — os ISRS (inibidores seletivos da recaptação de serotonina), como paroxetina, citalopram, escitalopram e sertralina — tende a causar menos efeitos colaterais físicos.
A fluoxetina — um ISRS também conhecido como Prozac — foi associada, no estudo, à redução de peso e ao aumento da pressão arterial.
O professor Andrea Cipriani, da Universidade de Oxford, afirmou que é “impossível” dizer quantas das milhões de pessoas que tomam antidepressivos deveriam estar usando um medicamento diferente.
Ele explicou, no entanto, que houve uma preferência por “medicamentos genéricos e baratos”, o que fez com que 85% das prescrições de antidepressivos no Reino Unido se concentrassem em apenas três drogas: citalopram, sertralina e fluoxetina, todas da classe dos ISRS.
Segundo Cipriani, aplicar as conclusões do estudo “reduziria drasticamente esses 85%”, permitindo que “mais pessoas tivessem acesso a tratamentos melhores”.
Os pesquisadores estão desenvolvendo uma ferramenta online gratuita para ajudar médicos e pacientes a escolher o medicamento mais adequado.
No entanto, isso ainda exigiria uma mudança significativa de cultura dentro do sistema público de saúde britânico (NHS).
O estudo analisou apenas o que aconteceu nas oito primeiras semanas após o início do tratamento. O dr. Pillinger afirmou que “dados complementares” indicam que as mudanças observadas no curto prazo “devem persistir”, mas que isso ainda precisa ser devidamente testado.
O dr. Prasad Nishtala, da Universidade de Bath, que não participou da pesquisa, classificou os resultados como “inovadores e valiosos”.
Segundo ele, “no mundo real, em que os pacientes costumam usar antidepressivos por meses ou anos, os riscos acumulados provavelmente são maiores, especialmente entre aqueles com depressão crônica”.
Por Painel da Cidadania
Fonte Correio Braziliense
Foto: BBC Geral