A beleza e a poesia das cidades

O que faz uma cidade bonita? Será a extensão de céu que se pode ver quando a vista atinge o horizonte? O número de estrelas que é possível contar?

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O que faz uma cidade bonita? Será a extensão de céu que se pode ver quando a vista atinge o horizonte? O número de estrelas que é possível contar? O balanço das copas das árvores no fim de tarde? Ou o tapete de flores que se forma no outono? Será o frescor da brisa sobre a pele cansada ou a luz potente e desavergonhada dos arranha-céus?

Conversava outro dia sobre a beleza incontestável de Brasília e me peguei a pensar sobre quais critérios a legariam este título. A capital tem tudo e um pouco mais. Um certo ar de cidade do interior a depender do canto em que nos refugiamos, misturado à efervescência de metrópole quando necessário.

As retas brutas que cortam o Planalto em vias com grau de objetividade assustadora se transformam em zigue-zagues infinitos quando você percebe que errou a entrada da Superquadra. Aliás, Brasília é super. Gigante tanto em seus propósitos quanto em suas contradições. Do Sol Nascente ao Plano Piloto, há distâncias muito maiores do que as que podem ser contadas em quilômetros — discrepâncias que precisamos endereçar com a maior urgência. Ela merece mais de nós, e nós merecemos mais de nossos governantes.

Fato é que Brasília construiu suas belezas ao longo dos anos. Em meio à vegetação do Cerrado, de árvores pequenas mas imponentes, e das águas que brotam como sopros de vida lá do alto, evocando o divino em cada gota, a tarefa tornou-se mais simples, é verdade. “Bastava não estragar”, como se diz por aí. A cidade, no entanto, está longe de ser unanimidade. Não vou elencar os motivos, guardo-me o direito de admirá-la mesmo em suas imperfeições. 

Mas não há motivo para competição. Viajar por aí é descobrir outras belezas e percebê-las em locais com características distintas. O samba imortal do Martinho da Vila foi preciso em seu resumo de um país plural e de dimensões continentais. “E o asfalto feito passarela / será a tela / de um Brasil em forma de aquarela”, diz o hino, tocando na Sapucaí de um Rio de Janeiro estonteante. A vista do Cristo, iluminado, ou do pôr do sol com os pés fincados na areia se deixando tocar pela água fria do mar é o que se pode chamar de divino.

E o que falar das selvas de concreto que saímos construindo por aí? Monumentos que nos lembram das nossas capacidades tanto quanto das nossas falhas, humanos que se erguem em museus, templos, casas, edifícios, moradas das nossas mais belas produções artísticas, intelectuais e espirituais. Talvez aí more também certa poesia, ou a própria poesia.

Por Israel Medeiros e Maria Beatriz Giusti do Correio Braziliense

Foto:  Minervino Júnior/CB/D.A.Press / Reprodução Correio Braziliense

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