Entre a vulnerabilidade e a violência: a trágica morte de João Miguel, 10 anos

O garoto foi encontrado morto numa área de mata do Lúcio Costa, a 12km do Palácio do Planalto. Ele também tinha uma tira de pano enrolada no pescoço. Polícia Civil investiga autoria e motivação da barbárie

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A pouco mais de 12km do Palácio do Planalto, em uma invasão no Setor de Inflamáveis, na região do Setor de Indústria e Abastecimento (SIA), o choque e o medo abalaram os moradores da área. Ali, onde vivem famílias em situação de extrema vulnerabilidade, João Miguel da Silva, de 10 anos, havia desaparecido há quinze dias. Ontem, porém, seu corpo foi encontrado, em uma fossa, a 5km de onde morava, envolto em um lençol, com mãos e pés amarrados. A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) trabalha com a hipótese de que ele tenha sido morto por asfixia. A possibilidade foi levantada porque, numa análise preliminar, os peritos criminais não identificaram na criança sinais de ferimentos que possam ter sido feitos a tiros ou por facadas.

O crime cometido contra o garoto perturbou a rotina de uma comunidade que acreditava viver num local, aparentemente, tranquilo. João, que há oito meses vivia com as tias e os primos em uma casa modesta no setor, era um garoto descrito por familiares e vizinhos como esperto e brincalhão, apesar de não frequentar a escola. A mudança para o endereço dos parentes ocorreu após a prisão do pai pela polícia, em dezembro de 2023, uma situação que transformou sua vida. Ainda no ano passado, os pais haviam se separado. O menino optou por ficar com o pai. Sua mãe, que havia se mudado para o Maranhão, retornou às pressas para o Distrito Federal assim que soube do desaparecimento do filho.

João Miguel tinha como costume se divertir com colegas na rua durante a tarde. Aconselhado pelas tias, evitava ficar muito distante de casa. Ao Correio, Rafaela Santos, 23, uma das pessoas que cuidavam dele, contou que, no dia do desaparecimento — 30 de agosto, uma sexta-feira — estranhou a demora do sobrinho para retornar ao lar. “Ele tinha saído para brincar, como sempre fazia. Depois, foi até a vendinha comprar um salgadinho, perto das 4h30 da tarde. Só que demorou a voltar e começamos a estranhar, daí saímos para procurá-lo”, relatou.

Imagens das câmeras de segurança do ferro velho situado em uma rua do setor filmaram João Miguel caminhando, sozinho. Os registros ocorreram no dia do sumiço e foram feitos praticamente no horário em que ele foi visto pela última vez. Na mesma via do estabelecimento com o sistema de vídeo que gravou o menino, fica o mercado em que ele teria ido fazer a compra. Depois disso, nada mais permite saber os passos da criança ou o que poderia haver ocorrido.

Buscas

Por duas semanas, familiares e vizinhos organizaram buscas pela mata da região. Foram espalhados cartazes pela área e também na Rodoviária do Plano Piloto e em outras regiões. “Foram dias de angústia. Não sabíamos mais o que fazer”, lembrou a tia.

No 11º dia do desaparecimento, a 8ª Delegacia de Polícia (Estrutural), que investiga o caso, divulgou a foto e informações do garoto, como as roupas que usava, idade, nome e por onde havia sido visto. Os investigadores receberam vários contatos com supostas indicações sobre o paradeiro. Todos eram falsas, exceto uma.

Ontem, uma denúncia detalhada mobilizou a polícia. Bem cedo, investigadores convocaram os familiares de João Miguel para que os acompanhassem numa ida a uma área de mata do setor Lúcio Costa, no Guará, a pouco mais de 5km de distância da casa onde o menino vivia. “Os policiais perguntaram quem estaria, entre nós, em condições emocionais para estar nessas buscas. Eu me ofereci. E quando chegamos, lá, senti que tinha algo errado. Eu estranhei o tanto de bombeiros e policiais que estavam na área”, relatou Rafaela.

Após alguns minutos de procura, as equipes localizaram o corpo em uma fossa com cerca de 1,5 metro de profundidade. João Miguel estava envolto em um lençol, com as mãos e pés amarrados, e uma tira de pano ao redor do pescoço. Preliminarmente, os peritos não encontraram sinais de perfurações causadas por arma de fogo ou faca. “A perícia de identificação civil da PCDF confirmou que o corpo localizado hoje (ontem) é o do menor desaparecido”, disse a delegada-chefe da 8ª DP, Bruna Eiras.

De acordo com a policial, ainda não é possível determinar com exatidão a causa da morte devido ao avançado estado de decomposição do corpo. A análise preliminar indicou que João faleceu há pelo menos três dias.

“Quem faria mal a essa criança? De 10 anos! Uma criança que nunca fez mal a ninguém. Como se explica isso?!”, reclamava, inconformada, a tia da vítima.

A polícia, agora, se dedica a identificar quem pode ter cometido o assassinato e a motivação. O caso foi classificado como prioridade.

Por Darcianne Diogo do Correio Braziliense

Foto: Ed Alves/CB/DA.Press / Reprodução Correio Braziliense

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